Em seu ateliê de mármore e luz, O pintor sonha, o pincel o conduz. Sob as cúpulas altas, em sombras douradas, Ele busca nas tintas as formas aladas. Com mãos trêmulas, esboça o divino, Um anjo sereno, de olhar cristalino. Cada traço, um suspiro de alma perdida, Cada cor, um reflexo da graça contida. Mas o anjo, em silêncio, observa a criação, Sentindo o peso da devoção. Em sua face, há luz e mistério, Entre o êxtase e o eterno, ele guarda um império. Ele sabe que é mais do que simples pintura, É a imagem do céu, presa à moldura. Suas asas abertas não podem voar, Pois o pintor lhe deu forma, mas não liberdade para amar. O pintor, em sua ânsia, busca perfeição, E o anjo, em silêncio, clama por redenção. Será que ele vê, nas cores que usa, A alma que dança, que vibra e que acusa? Pois nas penas douradas e no olhar celestial, Há um desejo oculto, um lamento mortal. O anjo, perfeito, sente-se incompleto, Preso à tela, sem vida, no quadro discreto. O pintor, tomado por sua paixão, Não vê a dor dessa criação. Busca no anjo a beleza imortal, Mas o que ele captura é apenas o final. O anjo chora em silêncio, sem pranto, Pois sua perfeição é o seu desencanto. E o pintor, em seu êxtase, termina a obra, Sem nunca saber que sua arte também sobra. Na tela, o anjo brilha, um ser sem igual, Mas por trás da beleza, há um véu de fatal. O pintor cria o divino com toque tão puro, Mas o anjo deseja o que nunca será seu futuro.